A FARRA CONTINUA: prefeito muda lei de Ocupação do Solo, privilegia empresários e endurece regras para o cidadão

Em setembro do ano passado, o prefeito Gleidson Azevedo foi ao MP colocar a disposição seus sigilos telefônico e bancário, após vazamento de áudios o ligando ao esquema de propina nas mudanças da Lei de Uso e Ocupação do Solo (Foto: Reprodução/Youtube)

No apagar das luzes de 2023, o prefeito de Divinópolis, Gleidson Azevedo (Novo), conseguiu emplacar a nova Lei de Uso e Ocupação do Solo, que traça regras para a divisão da cidade e cuida do zoneamento urbano. Essa legislação é de relevância fundamental, pois trata-se da ocupação da cidade em todos os níveis. A lei ainda em vigor, Lei 2.418, é de 1988 e foi elaborada pelo então prefeito Aristides Salgado, arquiteto, urbanista e professor da UFMG, com vasto conhecimento para tratar do assunto.

A nova Lei de Uso e Ocupação do Solo é oriunda do Projeto de Lei 61, que deu entrada na Câmara no dia 8 julho de 2021, seis meses após o prefeito tomar posse. No dia 31 de maio de 2022, o prefeito enviou um substitutivo ao projeto original e, no dia 26 de dezembro de 2023, o Projeto foi aprovado por unanimidade em sessão extraordinária da Câmara Municipal.

Nesta reportagem, o Portal do Sintram não vai detalhar as mudanças na legislação atual, por se tratar de regras que precisam ser analisadas e confrontadas para verificar o tamanho do impacto que a nova legislação vai causar na cidade. Entretanto, a nova lei privilegia o empresariado, com ampliação das áreas comerciais, principalmente nos bairros, além da criação dos centros de compras e serviços, prevendo, ainda, tratamento diferenciado para as edificações destinadas a shoppings centers e galerias comerciais. A nova legislação reduz as áreas de proteção ambiental, como também cria a Zona de Uso Múltiplo 2, ampliando a área para instalação de indústrias e empresas prestadoras de serviços.

Algumas peculiaridades foram verificadas na votação do Projeto e de suas emendas. Na votação da emenda 91, de autoria do vereador Edsom Sousa, que previa ampliar o espaço para a construção de garagens, a vereadora Ana Paula do Quintino (PSC), líder do prefeito, disse que votaria de acordo com o Projeto original porque não tinha “entendimento do assunto”. O vereador Anderson da Academia (PSC) disse que votaria de acordo com o projeto original, porque precisava de mais tempo, mesmo após 30 meses de tramitação da proposta.

Outra revelação foi a influência de “construtores” na apresentação de emendas para mudar o projeto original. Segundo o vereador Roger Viegas, ao discutir a emenda 94, de sua autoria, os construtores procuraram vereadores a quem eles tinham “afinidade” para propor as mudanças.

A nova lei ainda não foi sancionada pelo prefeito. Após sancionada, ela entrará em vigor 90 dias após sua publicação. Após seis meses de vigência da nova legislação, a Lei ainda em vigor, a 2.418, será revogada automaticamente.

OPERAÇÃO GOLA ALVA

Quando se fala em zoneamento urbano, com aprovação da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo, é inevitável não traçar um paralelo com a Operação Gola Alva, conduzida pelo Ministério Público de Minas Gerais. A operação culminou com o afastamento dos vereadores Rodrigo Kaboja (PSD) e Eduardo Print Júnior (PSDB), acusados de usar a Lei de Uso e Ocupação do Solvo para recebimento de propina. Somente no atual mandato, o MP levantou que Kaboja recebeu R$ 120 mil em propina, e Print Júnior R$ 55 mil, para apresentação e aprovação de projetos de mudança de zoneamento. Os dois são acusados de corrupção e lavagem de dinheiro.

O prefeito Gleidson Azevedo (Novo), embora apareça diversas vezes na investigação intermediando negociatas entre os vereadores e empresários, não foi denunciado pelo MP. Kaboja e Print Júnior já são réus em ação criminal na 2ª Vara Criminal de Divinópolis e respondem a um processo de cassação na Câmara. Por enquanto os dois continuam somente afastados dos cargos e recebem normalmente o salário de R$ 10,5 mil, como também receberam o 13º salário.

A FARRA

A cobrança de propina por vereadores para mudanças na lei de Uso e Ocupação do Solo é antiga. Na denúncia que apresentou à Justiça contra Rodrigo Kaboja e Eduardo Print Júnior, o MP afirmou que a Operação Gola Alva se limitou a investigar os crimes cometidos nos últimos três anos, mas afirmou que “a prática é antiga”. Só para se ter uma ideia, de 1989 até julho de 2023, a Lei de Uso e Ocupação do Solo foi modificada pelos vereadores 317 vezes. Todas essas mudanças tiveram como objetivo alterar zoneamento de residencial para comercial, inclusive em áreas protegidas.

O prefeito Gleidson Azevedo, que aparece na investigação do MP várias vezes com diálogos comprometedores e intermediando aprovação de projetos de mudanças na lei entre empresários e vereadores, foi autor de 38 projetos de mudança na Lei de Uso e Ocupação do Solvo nos primeiros três anos de mandato, além de ter emplacado a nova legislação. O último projeto de autoria do prefeito para mudança de zoneamento foi protocolado na Câmara no dia 27 de dezembro. Trata-se do Projeto de Lei 117/2023, que permite a construção da sede do 23º Batalhão da PM na Rua Caratinga, no Bairro São José.

Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram