Durante audiência sobre assédio moral, senador cita exemplo já registrado em Divinópolis

 

A Comissão de Assuntos Sociais do Senado realizou neta terça-feira (2) audiência que discutiu os impactos do assédio moral no serviço público. O debate foi promovido por iniciativa do senador Fabiano Contarato (PT-ES). De acordo com o senador, o assédio contra servidores públicos é usado hoje como método de governo e instrumento de poder, com base na violência institucional entre subordinados e órgãos hierárquicos.

Fabiano Contarato condenou todas as formas de assédio e disse que a prática prejudica os servidores e a própria democracia. “Há servidores da área de segurança pública que sofrem por cumprirem legalmente as atribuições estabelecidas na Constituição, em defesa da democracia e dos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade para preservação das instituições”, disse ele.

O FATO

O exemplo citado de pelo senador, ocorreu em Divinópolis na manhã do dia 10 de julho do ano passado, quando o prefeito de Divinópolis, Gleidson Azevedo (PSC), atacou um agente de trânsito, que cumpria seu papel de servidor da segurança pública, ao abordar um motorista que havia estacionado em local proibido no Bairro Esplanada. O próprio prefeito publicou em suas redes sociais um vídeo mostrando a fúria com que ele atacou o agente, que foi desautorizado pelo chefe do Executivo a multar o motorista infrator. O fato ganhou repercussão nacional.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Divinópolis e Região Centro-Oeste (Sintram), Wellington Silva, lembra que na ocasião, o sindicato deu todo o suporte ao agente, inclusive disponibilizando o departamento jurídico para as medidas legais. O presidente lembra que as denúncias de assédio, principalmente nos dois primeiros anos da atual administração, cresceram consideravelmente. “Realmente tivemos denúncias de vários setores da administração e isso motivou um encontro da diretoria do Sindicato com o Executivo para tratar da questão. Após esse encontro, as denúncias diminuíram. Mas sabemos que o assédio a servidores ainda é uma situação real, mas infelizmente por medo de retaliações, esses fatos não são denunciados pelas vítimas”, relata o presidente.

Wellington Silva esclarece que o Sindicato já fez campanhas contra o assédio e está pronto para defender o servidor que passar por situação semelhante. “O servidor que se sentir ameaçado, constrangido, ofendido por superiores terá sempre o apoio do Sindicato. Nossa diretoria estará sempre pronta para defender a categoria”, afirmou o presidente.

PERSEGUIÇÃO  

Durante a audiência no Senado, a senadora Zenaide Maia (Pros-RN) avaliou que o assédio institucional acentuou-se nos últimos três anos, com a perseguição a servidores de diversos setores. Para o senador Jean Paul Prates (PT-RN), a destruição do Estado faz parte de uma estratégia deliberada que tem a ver com ideologia.

“A ideologia tem lado e a política tem ideologia, uma coisa não caminha sem a outra. Talvez deixando a ideologia de lado, a opinião pública tenha sido contaminada com essa ideia de Estado mínimo, que o Estado não tem que ser discutido. A criminalização da política faz parte desse capitulo pelos próprios eleitos, e depois o sufocamento financeiro para imposição do Estado mínimo por falta de estrutura, sucateamento. E ainda o constrangimento claro nas garantias de desempenho das carreiras públicas, isso começa no desrespeito das próprias nomeações”, afirmou.

O Presidente da Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (Anesp), Pedro Pontual disse que o recrutamento de pessoas em postos de gestão está absolutamente incorreto: “deixou de ser a boa gestão, o critério e voltou de novo a obedecer cegamente”.

De acordo com o presidente do Sindicato Nacional dos Servidores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Celso Cardoso Júnior, desde o governo Michel Temer há uma mudança de clima organizacional na maior parte das organizações públicas, sobretudo no âmbito federal.

“O assédio sempre existiu, tanto no setor público como privado, de onde provém. Não é exclusividade do período recente. Porém, o que começamos a verificar no governo Temer, com maior profusão no governo Bolsonaro, foi um aumento estrondoso de casos. Não era mais uma relação pretérita individualizada entre pessoas envolvidas, passou a ser mediada pela organização ou pelo processo institucional”, afirmou.

O presidente do Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques disse que o período atual é o mais prejudicial para as instituições públicas nos últimos 30 anos. De acordo com ele, o fórum tem documentação farta sobre casos de assédio.

“Desde a redemocratização, não me ocorre tempo mais nefasto para as instituições, carreiras e órgãos públicos. Não foram casos isolados. São mais de 1,3 mil casos documentados de assédio moral e institucional no serviço público. Isso está em um contexto que está documentado. São 850 páginas registrando tudo isso, mais uma documentação de caso a caso”, afirmou.

Para a vice-presidente nacional da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil, Thaisse Craveiro, a prática de assédio institucional é “grave e generalizada”.

“As ações orquestradas relacionadas ao assédio institucional se manifestam claramente por meio de avaliações de desempenho sem critério. A instrução de processos disciplinares tem hoje verdadeira subversão para perseguir agentes públicos, o que tem impedido a independência e a imparcialidade do agente público no exercício de suas funções. São exonerações de cargos em comissão, remoção imotivada, sindicâncias imotivadas que se arrastam por anos”, afirmou.

INPE

Demitido há três anos pelo então ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações Marcos Pontes, o ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)  Ricardo Galvão disse que sua demissão foi um exemplo claro de assédio institucional, por ele ter sido a “pedra no sapato de um governo que considerava o meio ambiente oposto ao desenvolvimento econômico do país”.

“Era uma estratégia de destruição dos órgãos públicos, em particular do Inpe, uma instituição respeitada internacionalmente e cujos resultados não poderiam ter sido contestados pelo governo. O assédio começou já em janeiro [de 2019], quando o governo Bolsonaro tomou posse. E foi um assédio contundente que nem todos viram”, afirmou.

Reportagem: Jotha Lee
Com informações da Agência Senado
Foto:
O autor do requerimento para a audiência, Fabiano Contarato, entre Priscilla Colodetti e Thaisse Craveiro, durante audiência na Comissão de Assuntos Sociais (Crédito: Waldemir Barreto/Agência Senado)