Ministério Público obriga Prefeitura a realizar concurso público e acabar com contratações temporárias

Vereador Roger Viegas, na sessão da Câmara do dia 28 de fevereiro: “O Ministério Público não quer trabalhar” (Foto: Reprodução/TV Câmara)

Uma medida adotada pelo Ministério Público de Minas Gerais contra a Prefeitura da cidade de Aimoré, no Vale do Rio Doce, serve parar traçar um paralelo da situação vivida hoje por Divinópolis. O MP acaba de ajuizar uma Ação Civil Pública (ACP) contra a Prefeitura daquela cidade, requerendo que o município seja obrigado a realizar concurso público no prazo de 180 dias. O MP explica que o objetivo é acabar com o excesso de contatos temporários de trabalho.  “A medida busca o provimento dos cargos efetivos atualmente existentes cujas atribuições estejam sendo desempenhadas por funcionários contratados, sejam temporários, prestadores de serviço ou admitidos indevidamente por processo seletivo”, explica o MP.

Conforme a ACP, a obrigação deve valer inclusive para cargos dos profissionais que atuam nos serviços, programas e projetos socioassistenciais da Secretaria Municipal de Assistência Social, assim como para aqueles vagos que surgirem no decorrer do processo e outros que eventualmente venham a ser criados por lei.

O MP requer, ainda, a revisão de todos os contratos temporários vigentes de admissão de pessoal, de todas as admissões por processo seletivo e de todos os contratos de prestação de serviços para atribuições concernentes a cargos efetivos, para fins de rescisão unilateral dos que se mostrarem ilegais. A instituição também pede que o Município de Aimorés seja proibido de firmar novos contratos temporários de admissão de pessoal, de processos seletivos ou de contratos de prestação de serviços.

PRÁTICA ILEGAL

Segundo o MP, há anos a Prefeitura de Aimorés preenche o seu quadro de pessoal ignorando as regras que regem a matéria, uma vez que contrata servidores sem concurso público, excessivamente e em desacordo com as normas constitucionais e legais. “O que se pode perceber, durante o trato da situação, é que a celebração de contratações temporárias e em caráter precário, de maneira geral, em detrimento da realização de concurso público, trata-se de prática padronizada e costumeira pelo demandado, isso é, estabelecida inversamente como regra”, afirma trecho da ação.

DIVINÓPOLIS

A Ação Civil Pública contra a Prefeitura de Aimorés foi impetrada de ofício pelo Ministério Público. O órgão entende que a Prefeitura da cidade está driblando a legislação e, por consequência, causando prejuízos ao erário.

Divinópolis vive situação idêntica. Em 1998, as contratações temporárias foram legalizadas no município, através da Lei 4.450, de autoria do então prefeito Domingos Sávio, à época filiado ao PSDB. A lei fixou as regras para “contratação de pessoal por prazo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”.

Ao longo dos anos, a legislação vem sendo burlada e as contratações temporárias vêm sendo feitas repetidamente para os mesmos cargos e vagas, sem que o município adote providências para a realização de um concurso público para acabar com essa lacuna. Ao contrário, o prefeito  Gleidson Azevedo (PSC) está aumentando as possibilidades de ampliar as contratações temporárias. No dia 24 de novembro do ano passado, ele protocolou na Câmara o Projeto de Lei 87/2022, que acabava com o prazo para as contratações temporárias, permitindo que os contratos administrativos de trabalho fossem renovados por prazos indefinidos. Atualmente a Lei permite a contratação por um ano e renovação por mais um. A proposta do prefeito era renovar os contratos indefinidamente.

A diretoria anterior do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Divinópolis e Região Centro-Oeste (Sintram) se posicionou imediatamente contra o projeto, uma vez que a mudança proposta pelo prefeito, além de  acabar com a necessidade de realização de concursos públicos, ainda permitiria o aumento dos servidores sob o regime de contratos temporários. A atual diretoria, liderada por Marcos Aurélio Gomes, também mantém o mesmo posicionamento. O Sintram, assim como os servidores, defendem a realização de concursos para acesso ao serviço público municipal.

Após a manifestação do  Sintram, o prefeito Gleidson Azevedo enviou à Câmara uma Mensagem Modificativa ao projeto, protocolada no dia 26 de dezembro do ano passado. A mensagem altera o projeto original e limita a possibilidade de renovação indefinida dos contratos temporários em situações específicas. Com as alterações encaminhadas pelo prefeito à Câmara, os contratos poderão ser renovados sem limite de prazo somente nas seguintes situações:

  • atendimento a situações declaradas de calamidade pública;
  • combate a surtos endêmicos no Município; e
  • continuidade dos serviços considerados essenciais e inadiáveis nas áreas de educação e saúde, nas hipóteses previstas no 10 da Lei Federal nº 7.783/89

O projeto, que foi protocolado com pedido de regime de urgência em novembro, continua tramitando na  Câmara e ainda não recebeu os pareceres das comissões permanentes do Legislativo.

“Nossa preocupação com excesso de contratos temporários é mais do que justificada. A própria Constituição da República, bem como a nossa Lei Orgânica, definem que a entrada no serviço público deve ocorrer por concurso. Alem disso, temos a situação do Diviprev [Instituto de Previdência] que não consegue equilibrar receita e despesa, apresentando recorrentes déficits que colocam em risco sua sobrevivência. A única forma de equilibrar a situação do Diviprev é aumentar sua receita e o único meio de fazer isso é aumentando o número de contribuintes, o que só pode ocorrer com o aumento do número de servidores efetivos. Essa é a nossa grande preocupação”, destaca o presidente do Sintram, Marco Aurélio Gomes.

De acordo com a base de dados do Diviprev, a Prefeitura de Divinópolis fechou 2022 com 5.195 servidores, dos quais 1.500 estão sob o regime de contratos temporários. Isso significa que 28,80% de toda a mão de obra da Prefeitura deixa de contribuir para o Diviprev, já que as contribuições dos trabalhadores contratados temporariamente são feitas par ao Regime Geral de Previdência (INSS).

MINISTÉRIO PÚBLICO

O MP tem assistido a essa situação passivamente e nenhum questionamento foi feito pelo órgão ao Executivo sobre o excesso e a continuidade das contratações temporárias. Na sessão da Câmara, do dia 28 de fevereiro, o vereador Roger Viegas (Republicanos) criticou duramente a atuação do MP em Divinópolis que, no seu entendimento, tem se omitido na fiscalização do Executivo.

“(…) afinal de contas, o Ministério Público, aqui da cidade…. olha, sinceramente, esse não tem vontade de agir. Tenho todo respeito, um imenso respeito [pelo MP], mas chega de enganar o povo. (…) Nunca achei que eu ia sentir saudade do [promotor] Gilberto Osório, tanta saudade assim. E olha que o Gilberto Osório já me fiscalizou… estava tranquilo, quem não deve, não teme. Tenho saudade, porque ele fiscalizava, doa a quem doer. Seja político de alta patente, seja de baixa, assim como eu, qualquer um. O Ministério Público [de Divinópolis] agora não quer agir”, criticou o vereador.

Para criticar a inércia do Ministério Público na cidade, Roger Viegas citou o exemplo da CPI da Copasa, instaurada na Câmara Municipal em 2018, que, segundo ele, entregou ao MP uma vasta documentação sobre a atuação da empresa. O relatório da CPI citada por Viegas para criticar a atuação do MP na cidade, se transformou no Decreto Legislativo 21/2018 e conclui sobre a existência de “fortes indícios de irregularidades [na Copasa] que devem ser avaliadas tanto pelo executivo municipal para as correções devidas, como também, pelo Ministério Público para as responsabilizações cabíveis, uma vez que o gestor não é o dono do interesse público, ele é um preposto, é um cumpridor de leis, ele só pode fazer o que a lei autoriza”, diz o relatório entregue ao MP, que até hoje não adotou nenhuma medida contra a Copasa, assim como também, de ofício, não adotou nenhum procedimento para investigar a avalanche de contratações temporárias pela Prefeitura de Divinópolis.

Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram