Os excessos cometidos na utilização dos cargos comissionados na Prefeitura de Divinópolis voltaram a ser destaque essa semana, após críticas feitas na Câmara Municipal pelo vereador Roger Viegas (Republicanos). O vereador citou somente o caso do assessor para assuntos comunitários e ex-candidato a prefeito, Will Bueno, que recebe uma gratificação mensal de 40%. Nesse caso especificamente, o salário previsto em lei é de R$ 8.433,11. Com a gratificação (R$3.373,24), o salário bruto de Will Bueno em julho chegou a R$ 12.106,55.
O caso de Will Bueno não é único, uma vez que os 134 ocupantes de cargos comissionados no atual governo recebem gratificações que variam de 40% a 100%. As gratificações estão previstas na Lei 8.480/2018, sancionada pelo então prefeito Galileu Machado (MDB). Em dezembro de 2016, o então prefeito Vladimir Azevedo (PSDB), através da Lei 8.255, promoveu uma reforma administrativa, que definiu 208 cargos comissionados para a Prefeitura. Em 2018, Galileu Machado revogou a lei 8.255, fez nova reforma administrativa subindo para 221 o número de cargos comissionados e criando as gratificações que são pagas hoje aos ocupantes dos cargos de confiança. Até 2018 não havia gratificações para esses cargos.
O Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Divinópolis e Região Centro-Oeste (Sintram) vem travando há anos uma dura batalha pela redução do número de cargos comissionados. “Sempre nos posicionamos contra o excesso de cargos comissionados. A luta do Sintram é pela moralidade e por justiça no serviço público. Também não podemos concordar com gratificações absurdas que aumentam ainda mais os desníveis salariais, afetando tão somente a grande massa de servidores, já que 80% da categoria ganha R$ 1,5 mil e não possui esse privilégio”, diz o presidente em exercício do Sintram, Wellington Silva.
PROCURADOR
A lei 8.480 que concedeu as gratificações aos cargos comissionados foi aprovada na sessão da Câmara Municipal do dia 20 de julho de 2018. A proposta apresentada por Galileu Machado foi aprovada por 11 votos favoráveis e dois contrários. Votaram a favor os vereadores Adair Otaviano, Ademir Silva, César Tarzan, Delano Santiago, Josafá Anderson, Marcos Vinícius Alves da Silva, Nêgo do Buriti, Raimundo Nonato, Renato Ferreira, Rodrigo Kaboja e Zé Luiz da Fármacia. Votaram contra Cleiton Azevedo e Sargento Elton.
Além de aumentar de 208 para 221 o número de cargos comissionados, Galileu ainda conseguiu aprovar as gratificações e é como justificativa da obrigação de cumprir essa lei, que o atual prefeito Gleidson Azevedo (PSC) continua pagando essas vantagens. Entretanto, se fosse desejo do atual prefeito acabar com essas aberrações, bastava a ele elaborar uma nova reforma administrativa, revogando as gratificações previstas na atual legislação.
A gratificação de 40% paga a Will Bueno é a menor prevista pela Lei. A grande maioria dos cargos de confiança tem gratificação de 100%. Um dos exemplos é o caso do procurador geral do município, Leandro Luiz Lemos, que em julho teve um salário bruto de R$ 20.969,49. Pela lei 8.480, ele recebe uma gratificação de 50,5% sobre o salário. De acordo com o extrato da folha de pagamento, disponível no Portal Transparência, Leandro Luiz recebeu 50,5% a título de gratificação de função (R$ 4.258,72), mais 90% de gratificação de produtividade (R$ 7.589,80), ou seja, obteve 140,5% de vantagem no mês de julho.
Em resposta ao Jornal Agora, que questionou as gratificações, a Prefeitura disse que o pagamento é feito “em razão das condições do local e/ou natureza da prestação do serviço ou para o exercício de atribuições especiais de chefia, direção e assessoramento de programas e/ou projetos junto ao poder executivo”. A Prefeitura disse ainda que as gratificações são revistas a cada gestão pelo Executivo Municipal”, o que é uma inverdade, já que elas só começaram a ser pagas no governo passado e continuam no governo atual.
Veja no quadro abaixo o percentual das gratificações pagas para os cargos comissionados
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GATILHO
Ao justificar o pagamento das gratificações, a Prefeitura argumenta que é obrigada a isso, pois está previsto em lei. Entretanto, o prefeito se mostra um “grande cumpridor” das leis para conceder vantagens a uma minoria, ocupante de cargo de indicação política, mas não se vê obrigado a cumprir a Lei 6.749/2008, que criou o gatilho automático para os servidores como forma de garantir a recomposição das perdas salariais. O índice do gatilho foi definido pela Lei 8.083/2015. Além de não ser vantagem, já que sua função é recompor as perdas salariais, o gatilho beneficia a grande massa de trabalhadores que ganham R$ 1,5 mil, já que 80% dos servidores estão nesta faixa salarial.
O prefeito se nega a conceder a revisão salarial, argumentando que a Lei Complementar Federal 173/2020, que estabeleceu o programa federal de enfrentamento ao coronavirus, vedou a concessão de vantagens para servidores públicos até o final desse ano. O entendimento do procurador do município, Leandro Luiz Lemos, que em julho recebeu gratificação de 140,5%, é que essa bonificação que ele recebe não é uma vantagem, motivo pelo qual não estaria vedada pela Lei 173. Por outro lado, o procurador orienta o prefeito a não pagar o gatilho, que também está previsto em Lei, sob o argumento de que não se pode conceder vantagens aos servidores até o final do ano.
“O prefeito quer brincar com nossa inteligência? Ora, gratificação não é vantagem? Já a revisão de salário, como é definido pela própria Constituição da República, é a manutenção do poder de compra do salário, ou seja, não é concessão de vantagem ou aumento para o servidor. Basta fazer a leitura do inciso VIII, do artigo 8º da lei 173 e observa-se que a recomposição salarial não está vedada, como argumenta o prefeito e seus procuradores. De acordo com o inciso, os prefeitos estão proibidos de ‘adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal’. Veja bem, observada a preservação do poder aquisitivo, que nada mais é do que a recomposição inflacionária dos salários. Portanto, o prefeito, a vice e sua equipe não devem continuar abusando de nossa Inteligência e sejam honestos e digam que não querem dar o gatilho porque esse governo não tem compromisso com o servidor que realmente trabalha e está na ponta do serviço público”, afirma Antônio Leonardo Rosa, diretor Jurídico do Sintram.
Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram