MPF ajuíza ação em Minas Gerais para impedir Caixa Econômica de financiar imóveis pelo método de alvenaria estrutural

O Ministério Público Federal (MPF) em Minas Gerais ajuizou ação civil pública, com pedido de tutela de urgência, para que a Caixa Econômica Federal seja impedida de conceder financiamento para a construção de residências multifamiliares mediante o método de alvenaria estrutural, sem que os responsáveis pela construção e execução do projeto apresentem, previamente, laudo técnico de empresa especializada em estudos geológicos, geotécnicos e estrutural. O laudo precisa atestar que o terreno, considerando suas condições naturais, seja apropriado para o empreendimento e não apresenta risco para a estabilidade das edificações.

Os responsáveis pelo empreendimento devem indicar também quantas unidades podem ser construídas na área, a quantidade de pavimentos das edificações, além da capacidade para suportar e resistir a possíveis alterações das condições naturais do solo e suas características geológicas.

Segundo a ação, essa metodologia de construção, fora de especificações eminentemente técnicas, além de restringir o direito de propriedade, podem colocar em risco a integridade física dos moradores. Esses riscos são potencializados se os imóveis são construídos com mais de um pavimento, próximos a rodovias com grande movimentação de veículos de cargas ou em terrenos de reconhecida instabilidade geológica.

Em razão disso o MPF também pediu que a Caixa ainda seja impedida de financiar qualquer unidade construída pelo método de alvenaria estrutural, se não houver a comprovação prévia de que o adquirente teve acesso à completa informação sobre o modelo construtivo adotado. O banco também precisa fornecer ao mutuário o acesso e a ciência prévia de laudos técnicos sobre estudos geológicos, geotécnicos e estruturais da edificação, com indicação da qualidade dos materiais que serão empregados no empreendimento. Outro pedido na ação é que o material utilizado terá de atender às especificações da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

Histórico – Em 2018, o MPF recebeu denúncia na qual a Caixa estaria se omitindo nas análises do padrão das obras edificadas com recursos do sistema financeiro de habitação, bem como por outras fontes, como o Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV). Segundo a denúncia, a Caixa vem aprovando financiamentos de imóveis construídos mediante alvenaria estrutural, que não permite alterações por haver risco de comprometimento da estrutura, mas não informa isso aos futuros proprietários.

Em razão disso, naquele mesmo ano, o MPF recomendou à Caixa que se abstivesse de liberar recursos para financiamento de projetos cujo padrão de qualidade não atendesse as normas de segurança, mediante prévia comprovação do construtor junto a empresa pública. Em resposta, a instituição financeira limitou-se a informar que as suas operações de financiamento cumprem normas técnicas relacionadas aos elementos e métodos construtivos, respeitados os critérios de funcionalidade, habitabilidade, acessibilidade e segurança do uso. Além de que, na hipótese de algum sinistro, haveria responsabilidade exclusiva das construtoras, de seus representantes e dos responsáveis pela elaboração de projetos e execução da obra.

De acordo com o procurador da República Cléber Eustáquio Neves, autor da ação, a técnica de alvenaria estrutural impossibilita a realização de quaisquer alterações internas ou externas pelo adquirente do imóvel, sob pena de comprometimento da solidez da construção e risco de desabamento. No entanto, boa parte dos contratos celebrados pela Caixa sequer tal metodologia construtiva é previamente informada aos adquirentes de unidades, antes da celebração do contrato.

Para o procurador, essa informação acerca de determinado produto ou serviço é um direito básico do consumidor, conforme determinam os artigos 4º, inciso IV e 6º, inciso III do Código de Defesa do Consumidor. “Esse direito, também conhecido como princípio da transparência, implica ao fornecedor do produto ou prestador de serviços o ônus de explicitar, de maneira clara, inteligível e exauriente, todas as condições do negócio, em todas as suas fases”, afirma Cléber Eustáquio na ação.

Falta de manual – Outro problema detectado é que a maioria das construtoras não tem por praxe entregar ao adquirente o manual de orientação sobre a correta utilização, conservação e manutenção da unidade habitacional, em consonância com as disposições da ABNT, notadamente as NBRs 5674, 14037 e 15575. O morador não é informado que a estrutura não pode ser modificada, situação que restringe a liberdade de reforma e alterações do projeto.

No tocante à alvenaria estrutural, o consumidor sequer é informado sobre qual o tipo de bloco será empregado, muito menos se atende às normas técnicas da ABNT. “A Caixa Econômica Federal sequer tem o costume de exigir da construtora, como condição para aprovação de projetos e liberação de recursos, um manual de especificações e manutenção que deve obrigatoriamente ser entregue ao adquirente, um instrumento importante para correta e adequada manutenção e conservação da unidade habitacional”, salienta o procurador.

Em razão disso, o MPF também pediu para que a Caixa não financie empreendimentos em que a construtora não se obrigou, previamente, a repassar ao adquirente o manual de especificações e manutenção das áreas comuns e individuais (ABNT NBRs 5674, 14037 e 15575).

Outros pedidos – O MPF requereu à Justiça, ainda, que a Caixa não financie qualquer unidade habitacional se não ficar comprovado, previamente, antes da celebração do contrato, que o adquirente foi previamente informado sobre o método construtivo adotado. Deve ser informado também se o imóvel é ou não passível de alterações externas ou internas, sob risco de comprometimento de sua estrutura.

Tais informações devem estar escritas em mesmo tamanho e fonte utilizados em todos os anúncios e formas de publicidade sobre a venda das unidades. Também deve constar dos contratos de financiamento que a construtora será a responsável pela solidez e segurança das unidades. Se forem constatados vícios e defeitos construtivos, caberá a ela fazer a manutenção e a conservação da unidade, no prazo de 30 dias, assim que devidamente notificada pelo morador.

Dano moral – O MPF pediu a condenação da Caixa ao pagamento de danos morais coletivos, observado o valor mínimo de R$ 100 mil por cada uma das unidades financiadas pelo banco nos últimos cinco anos, construídas segundo a metodologia de alvenaria estrutural, em cujos contratos não consta a ciência prévia das restrições impostas ao direito de propriedade, notadamente de se fazer qualquer alteração na unidade, em função do risco de comprometimento da estrutura. O pedido do MPF estende-se também aos contratos que os mutuários não receberam o Manual de Especificações e Manutenção de Áreas Comuns e Individuais.

(ACP – 1013638-23.2021.4.01.3803 – Pje)

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Fonte: MPF-MG
Foto: divinopolis.mg.gov.br