Governo entrou em conflito com agenda anticorrupção em 2019; veja casos

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi eleito, em grande medida, sob o discurso de rompimento do chamado “toma lá, da cá”, o surgimento de uma nova política que viria a “mudar tudo que está aí” e o combate à corrupção. Mas, segundo o ranking de percepção de corrupção, elaborado pela Transparência Internacional, pelo menos este último quesito não tem sido cumprido pelo Governo.

O gráfico demonstra que de 2012 até 2019, o Brasil tem seu quadro de corrupção piorado mantendo em 2019, a pior média histórica

Segundo a avaliação da entidade, “a corrupção segue como uma das maiores barreiras ao desenvolvimento econômico e social brasileiro”. A Transparência destaca ainda que este é um sinal da frustração das expectativas de avanço no enfrentamento da corrupção e na promoção da integridade no país.

A Transparência Internacional afirma que em 2019 houve um aumento das “tentativas de interferência política do Palácio do Planalto nos órgãos de controle, com substituições polêmicas na Polícia Federal e Receita Federal e nomeação de um Procurador-Geral da República fora da lista tríplice”.

Em agosto, o presidente Bolsonaro trocou o comando da Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro, o ato provocou um intenso desconforto entre a instituição e o Planalto. Bolsonaro afirmou que a troca do superintendente Ricardo Saadi se deu por “questões de improdutividade”. O que foi desmentido pela própria Polícia Federal. O órgão disse que a troca estava prevista há meses, e havia partido de um pedido do próprio superintendente.

O Sindicato dos Delegados de Polícia Federal no Estado de São Paulo (SINDPF-SP) afirmou que o presidente age com desrespeito e atenta contra a autonomia da PF. Sob o comando de Saad, a polícia federal deflagrou importantes fases da Lava Jato no estado, implicando políticos, empresários e doleiros. Também houveram importantes operações contra milicianos no Rio.

Em 2019 Bolsonaro comentou por diversas vezes o desfecho de investigações em andamento, demonstrando ter tido acesso à informações privilegiadas sobre os casos e mais uma vez colocando em cheque a autonomia que o Governo daria à PF. Críticas às investigações da Polícia Federal também foram disparadas pelo presidente da República, quanto ao caso envolvendo Adélio Bispo, por exemplo.

Jair Bolsonaro também interferiu na Receita Federal. O mandatário determinou a substituição do superintendente do órgão no Rio de Janeiro, Mário Dehon, e dos delegados da Receita no Porto de Itaguaí (RJ) José Alex Nobrega de Oliveira, e na Barra da Tijuca, Fábio Cardoso do Amaral.

O presidente confessou que a insatisfação com a Receita se dera por questões pessoais. “Fizeram uma devassa na vida financeira dos meus familiares do Vale do Ribeira”, afirmou.

A escolha de Augusto Aras como procurador-geral da República (PGR) também acendeu a discussão sobre as barreiras que o Planalto colocou no caminho do combate à corrupção do país. O nome do PGR estava fora da lista tríplice, elencada pelos procuradores. A escolha desagradou membros do Ministério Público, que lançou uma nota dura contra o governo. Para os procuradores, a escolha fora da lista tríplice contraria uma tradição democrática.

CORRUPÇÃO DE PESSOAS PRÓXIMAS

O presidente é cercado de pessoas envolvidas em casos suspeitos de corrupção, algumas, inclusive, denunciadas e/ou condenadas por isso.

O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, é suspeito de coordenar um esquema de candidaturas laranjas no PSL de Minas Gerais. Ele segue sendo investigado e mesmo após diversas testemunhas citarem o nome do ministro com os casos de corrupção, o governo mantêm ele no cargo. Marcelo nega as acusações.

O ministro da Casa Civil e braço forte de Jair Bolsonaro, Onyx Lorenzoni, assumiu ter recebido recursos de caixa dois da JBS. A confissão aconteceu em 2017, ele disse ter sido beneficiário com R$ 100 mil repassados pelo grupo. O ministro diz ter se arrependido. Bolsonaro o convidou ainda assim para o cargo de confiança, e mesmo após a repercussão negativa o mantém por perto no Governo.

Carlos e Flávio Bolsonaro, filhos do presidente da República, também têm seus nomes envolvidos em casos suspeitos de corrupção.

O Ministério Público do Rio de Janeiro tem indícios de que Flávio Bolsonaro e sua esposa, Fernanda, compraram dois imóveis em Copacabana no valor total de R$638,4 mil. O pagamento teria sido feito em dinheiro vivo, cuja origem vinha de ‘rachadinhas’ realizadas no gabinete do então deputado estadual. Na época, Flávio ocupava uma cadeira na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

As investigações sobre o senador Flávio Bolsonaro começaram em 2018, após o Coaf encaminhar para o Ministério Público relatórios sobre movimentações atípicas, no período entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, na conta de Fabrício de Queiroz, assessor de Flávio Bolsonaro, que era deputado estadual no período.

Já o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, é alvo de duas investigações no Ministério Público do Rio de Janeiro que apontam irregularidades em seu gabinete na Câmara Municipal.

“O Grupo de Atribuição Originária Criminal da Procuradoria-Geral de Justiça (GAOCRIM/MPRJ) e a 8ª Promotoria de Justiça de Cidadania da Capital confirmam a existência de procedimentos sobre o tema (Carlos Bolsonaro), e esclarecem que as investigações estão sob sigilo”, informou o MP.

Os filhos de Bolsonaro e o próprio presidente negam terem envolvimento com qualquer movimentação ilícita de recursos públicos.

Mapeamento feito pelo jornal O Globo aponta ainda que desde 1991, quando o atual presidente Jair Bolsonaro foi eleito para seu primeiro mandato como deputado federal, ele e seus três filhos que também seguiram carreira política empregaram em seus gabinetes 102 pessoas com alguma relação de parentesco com sua família ou pessoas com relações de parentesco entre si. A reportagem afirma que há indícios de que várias dessas pessoas não trabalharam de fato nos cargos.

Mais recentemente, foi revelado pela Folha de S. Paulo, que o chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Fábio Wajngarten, recebe dinheiro de empresas contratadas pela própria secretaria, por meio de uma empresa da qual é sócio. O secretário não vê conflito de interesses. Uma das clientes de sua empresa passou a ser líder de recebimentos de publicidade do Governo Federal em sua gestão. Mesmo após as revelações, o presidente manteve o secretário no cargo.

Sempre que o clã Bolsonaro é questionado sobre esquemas de corrupção, o presidente, seus filhos e parlamentares aliados afirmam que as denúncias acontecem para prejudicar o governo.

Fonte: Congresso em Foco