Vencedora da licitação da UPA administra uma única unidade em cidade com pouco mais de 37 mil habitantes

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A abertura dos envelopes do processo licitatório para a gestão da Unidade de Pronto Atendimento Padre Roberto Cordeiro (UPA 24h) em Divinópolis ocorreu nesta terça-feira (30). Foram cinco propostas e o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS) venceu o processo com o valor de R$ 91.043.671,20 para 60 meses de contrato. Isso significa que a proposta é R$ 20,7 milhões abaixo do teto máximo estabelecido pelo Edital, que foi fixado em R$ 111,8 milhões pela Prefeitura. Se homologada a licitação, o gerenciamento e administração da UPA custarão R$ 1.517.394,92 por mês à prefeitura de Divinópolis.

Em nota oficial divulgada logo após o processo, a Prefeitura informou que a vencedora está sediada em Belo Horizonte. Ao contrário do que diz a nota oficial, a Assessoria de Comunicação do  Sintram não conseguiu localizar a matriz do Instituto na capital mineira. Através do telefone (31) 3263-4073, que consta no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), foi informado que o endereço citado pelo IBDS em Belo Horizonte é apenas “uma central de atendimento” para receber recados. A assessoria de Comunicação do Sintram obteve o telefone celular pessoal do senhor Hercílio Martins, citado como “dono” do Instituto. Ele negou tratar somente de uma “central de atendimento” e disse que é um escritório compartilhado, onde trabalham várias empresas. Questionado porque não havia ninguém responsável no local para falar sobre a licitação, Hercílio Martins disse que “todos deveriam estar trabalhando fora” no momento da ligação. “Vamos deixar terminar todo o processo porque ontem foi apenas mais uma etapa. Quando terminar tudo vamos repassar todas as informações”, disse ele.

Foram localizados dois sites pertencentes ao IBDS: – https://ibdsocial.org.br/no qual não constam telefone e endereço da entidade. Já em um segundo siste – https://ibds-br.com.br/ –  consta como sede da entidade um endereço com telefone em Salvador, Bahia.

EXPERIêNCIA

A confirmar o resultado do processo, o IBDS assumirá a gestão da UPA em setembro em substituição à Fundação Santa Casa de Formiga, que administra a unidade desde 2014. Após cinco anos de gestão, a Santa Casa entregará a UPA sucateada, com equipamentos quebrados, outros já sem condições de uso, além deixar a gestão após uma administração totalmente ineficaz, com atrasos de salários, falta de material básico e outros itens de caráter indispensável para uma unidade de pronto atendimento.

As informações que foram possíveis averiguar a respeito do desempenho do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social são preocupantes e não revelam experiência suficiente para gestão de uma unidade do tamanho da UPA de Divinópolis. Na página do IBDS na internet constam poucas informações sobre suas atividades, não havendo dados sobre transparência, pessoal, entre outras questões relevantes e obrigatórias que devem ser informadas por uma organização social.

O IBDS informa apenas se tratar de “uma entidade privada, criada em 1997, sendo reformulada no ano de 2011, visando o auxílio na gestão pública no âmbito da Educação, Cultura, Saúde, Meio Ambiente, Ação Social e Gestão Administrativa”.

Ainda de acordo com as informações disponíveis em um dos sites da empresa, 22 anos após sua fundação, o IBDS tem apenas cinco clientes, sendo quatro prefeituras e uma empresa que trabalha no desenvolvimento de ferramentas da internet. Das quatro prefeituras clientes do Instituto, três estão em Alagoas e uma em Minas Gerais.

UPA MATOZINHOS

Após a homologação da licitação, o IBDS se tornará responsável pela gestão da maior UPA da região Centro-Oeste de Minas Gerais, com uma média de atendimento diário de 450 pacientes. A unidade tem 25 leitos e todos estão permanentemente ocupados, já que as vagas hospitalares disponíveis na cidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS), não atendem à demanda de atendimento regional. Os corredores ficam lotados com pacientes em macas e o atendimento até agora só tem sido possível graças à capacidade técnica e à experiência dos servidores que trabalham na unidade.

As quatro prefeituras clientes do IBDS são Ibategura, cidade com 15.606 habitantes; São José da Laje, com 23.855 moradores; e Messias, com 17.676 pessoas. Essas três cidades estão no estado de Alagoas e nenhuma delas possui unidade de pronto atendimento, conforme informa o site do Ministério da Saúde. A quarta cidade atendida pelo IBDS é Matozinhos, em Minas Gerais, localizada na região Metropolitana, onde a UPA local é administrada através de gestão compartilhada entre a Prefeitura e o Instituto. São apenas 30 funcionário sob responsabilidade do Instituto, incluindo três enfermeiros, três farmacêuticos, um assistente social e sete técnicos de enfermagem. Os 16 funcionários restantes são responsáveis pela limpeza, recepção e coordenação. O custo anual para o IBDS de toda a gestão da UPA de Matozinhos é de R$ 1.776.000,00, o que perfaz o montante de R$ 148 mil mensais.

A prefeitura de Matozinhos fica com a parte mais pesada, pagando aos médicos de todas as especialidades, contas como água, luz, telefone, internet e todo o material e medicamento utilizado pela unidade. A contrário de Divinópolis, onde o IBDS vai assumir a gestão total da UPA, em Matozinhos o Instituto é responsável somente pela gestão de pessoal e da parte administrativa da unidade, já que todos os protocolos de atendimento também ficam sob responsabilidade da Prefeitura.

Já em Divinópolis, a UPA 24h atende a uma média de 450 pessoas por dia, embora sua capacidade oficial seja de 350 atendimentos. Para isso, são 357 funcionários, dos quais 128 efetivos que são pagos pela Prefeitura. Para gerir a UPA Padre Roberto, o IBDS terá que desembolsar R$ 1.517.394,92 ao mês, conforme o valor apresentado para vencer a licitação.

COMPARATIVO
Divinópolis X Matozinhos

 

DIVINóPLIS

População – 235.977 habitantes (IBGE)
População Regional Atendida – 1,3 milhão (estimativa)
Capacidade atendimento da UPA – 350 pacientes/dia
Atendimento efetivo – mais de 450 pacientes (Semusa)
}Número de funcionários – 357

MATOZINHOS

População – 37.473 habitantes (IBGE)
População Regional Atendida – não há
Capacidade Atendimento UPA – 150 pacientes/dia
Atendimento efetivo – Média 40 pacientes (Prefeitura)
Número de Funcionários: 30

SITUAçãO CRíTICA

A situação crítica da UPA Padre Roberto não admite uma gestão que não seja altamente profissional. Essa situação vem se arrastando ao longo dos últimos anos sem que haja uma solução definitiva e fica ainda mais preocupante com a futura gestão, já que a Prefeitura quer transferir os 128 servidores efetivos que prestam serviços na unidade. São profissionais altamente qualificados, com mais de 20 anos de experiência e que conhecem a rotina da UPA  e suas dificuldades. Embora esses servidores queiram continuar prestando seus serviços na unidade, a Prefeitura insiste na transferência sem se preocupar com a qualidade do atendimento que será disponibilizado para a população a partir da nova gestão em setembro. Preocupa ainda mais quando o edital permite que a nova gestora contrate enfermeiros e técnicos de enfermagem com apenas um ano de experiência.

Na Câmara Municipal de Divinópolis, os vereadores também ignoraram a segurança da população e pouco antes do recesso de julho, os parlamentares derrubaram o Projeto de Lei do vereador Edson Sousa (MDB), exigindo que os servidores da UPA deveriam ter no mínimo três anos de experiência e 70% do quadro funcional deveria ser ocupado por funcionário efetivo.

Já em 2017 o alto custo da UPA, o atendimento além da capacidade e a falta de medicamentos, materiais e recursos para pagamentos da equipe levaram a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) a realizar uma audiência pública para discutir o assunto. A audiência não resultou em nenhuma solução efetiva.

Na ocasião, o então diretor administrativo da UPA, José Orlando Fernandes Reis (foto), explicou que, apesar da capacidade de atendimento de 350 pessoas, a unidade já estava estrangulada, com mais de 400 pacientes por dia, sendo que, em média, 7% deles necessitavam de atendimento hospitalar.

Preocupa ainda o fato de que em 2017, segundo José Orlando, o custo mensal da UPA já passava de R$ 2 milhões. A vencedora da licitação terá disponível pouco mais de R$ 1,5 milhão ao mês. Se em 2017 esse custo já era superior a R$ 2 milhões, é quase certo que não houve redução de custos na unidade. Se a nova gestora pretende gastar mais de R$ 500 mil mensais a menos, não é nenhuma ilação prever que haverá queda na qualidade do atendimento, pois certamente ocorrerá redução de serviços para que o valor mensal seja suficiente para cobrir as despesas.

SINTRAM

A presidente do Sindicato dos Trabalhadores Municipais de Divinópolis e Região Centro-Oeste (Sintram), Luciana Santos, afirma que a preocupação não é apenas com os servidores que estão para ser transferidos, mas com todos a população que necessita do atendimento da UPA. “O Sindicato vem batalhando para que os servidores efetivos sejam mantidos na UPA e a Prefeitura tem ignorado nossos apelos e argumentos. Pelo que estamos observando, a previsão não é boa, pois a vencedora da licitação nos parece não reunir as condições necessárias para administrar a unidade. Não estamos colocando em xeque sua capacidade de gestão. Mas, para quem administra uma única unidade de pronto atendimento para uma população de 37 mil habitantes, há uma diferença muito grande em assumir a gestão de uma unidade com mais de 350 funcionários, que atende a uma cidade que é macrorregião da saúde, ou seja, atende todo o Centro-Oeste e ainda por um valor abaixo dos gastos já verificados em 2017. Nossa expectativa é que tudo isso seja considerado e que a Secretaria de Saúde de Divinópolis tenha muito cuidado antes que a licitação seja definitivamente homologada”, disse a presidente do Sindicato.


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