Técnico do Dieese confirma tentativa do governo do Estado de forçar municipalização de escolas em Divinópolis

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Na Assembleia, o técnico do Dieese confirmou que o Estado está forçando a municipalização (Foto: Guilherme Dardahan/ALMG)

No dia 18 de agosto o Portal do Sintram publicou reportagem intitulada “Estado e Prefeitura de Divinópolis iniciam nova ofensiva para municipalização do ensino começando por três escolas” e revelou que a intenção inicial era municipalizar as escolas Nossa Senhora do Sagrado Coração, Halim Souki e a Escola do Bairro Belo Vale. No dia 21 de agosto, a municipalização voltou a ser tema de outra reportagem. Sob o título Prefeitura e Estado encaminham em surdina processo de municipalização de escolas em Divinópolis.

Enquanto isso, a secretária municipal de Educação, Andréia Dimas, e a Diretoria de Comunicação da Prefeitura tratavam de desmentir essas informações. A secretária chegou a afirmar que se tratava de fake news. Entretanto, Andréia Dimas havia enviado duas representantes da Secretaria Municipal de Educação (Semed) a uma reunião na Escola Estadual do Bairro Belo Vale, ocasião em que a superintendente Regional de Ensino, Luíza Amélia Coimbra, anunciou que a escola seria fechada e passaria a funcionar como um anexo da Escola Municipal Padre Guaritá.

Os desmentidos oficiais caíram por terra, quando o Portal do Sintram teve acesso a um documento oficial comprovando estar em andamento um processo de absorção de escolas estaduais pela rede municipal de Ensino. No dia 1º de setembro, uma reportagem revelou que governo do Estado e Prefeitura estavam com um processo em andamento para municipalizar parte do ensino fundamental.

O documento, um ofício encaminhado à direção da Escola Estadual Nossa Senhora do Sagrado Coração pela superintende regional para falar sobre o Plano de Atendimento Escolar (PAE) 2023/2024, mostrou que Estado e Secretaria Municipal de Educação já estavam alinhados. No ofício a superintendente  Luíza Coimbra expõe a ação para transferência de escolas estaduais para o município. “Para o ano de 2024 foi pensada uma reorganização de atendimento na região nordeste do município [Divinópolis], como forma de solucionar a coabitação [funcionamento conjunto] entre a Escola Municipal Professor Darcy Ribeiro e a Escola Estadual São Vicente”, informou o documento.

O ofício também desmentiu a secretária municipal de Educação, que afirmou não saber de nada. Segundo o documento “conforme entendimento entre a Superintendência e a Secretaria Municipal de Educação” o Plano de Atendimento Escolar propunha que a Escola Nossa Senhora do Sagrado Coração seria absorvida gradativamente pela Escola Municipal Darci Ribeiro. Ofício com o mesmo teor também foi enviado às escolas Belo Vale e Halim Souki.

AUDIÊNCIA PÚBLICA

Em audiência pública realizada nesta quarta-feira (20) pela Comissão de Educação da Assembleia Legislativa (ALMG), o economista e coordenador técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Diego Severino Rossi de Oliveira, afirmou que o governo estadual estaria usando o Plano de Atendimento Escolar (PAE) para extinguir as vagas do ensino fundamental estadual sem fazer consulta ao Legislativo, como forma de forçar a municipalização de escolas, exatamente como revelaram as reportagens publicadas pelo Portal do Sintram.

De acordo com o técnico do Dieese, a Resolução da Secretaria de Estado da Educação (SEE/MG) 4.869, de 2023, “deixa claro em seu texto que a prioridade de ofertas de vagas no ensino fundamental deve ser na rede municipal”.

Lançada em julho deste ano pelo Governo do Estado, a Resolução 4.869 estabelece normas e diretrizes para a elaboração do PAE. De acordo com Diego Severino, o documento é coerente com a visão do atual governo de que o ensino fundamental não deva ser ofertado pelo Estado.

“Desde 2021, o Governo do Estado já está nessa ofensiva [de municipalização] por meio do projeto Mãos Dadas. Poucos municípios aderiram, das 450 cidades que podem aderir, apenas 180 o fizeram, há resistência em várias câmaras municipais. Por isso, a alternativa foi usar o PAE para fazer essa descentralização do ensino fundamental”, afirmou Diego Severino.

O especialista apresentou gráfico demonstrando as quedas, desde 2016, de matrículas nas diversas modalidades de ensino promovidas pelo Estado, com o único avanço sendo no ensino médio, que é prioridade do governo.

“O impacto deve ser de redução de 56% no número de trabalhadores da educação após a implementação do PAE. Com a perspectiva de fechamento de quase 900 escolas em todo o Estado, onde os trabalhadores ficarão lotados? No PAE, isso não é esclarecido. Penso que o PAE é a terceira fase do Projeto Mãos Dadas e o objetivo é passar por cima das câmaras municipais, que têm sido empecilho à realização do que o Estado deseja”, disse o técnico do Dieese.

A Superintendente de Organização Escolar e Informações Educacionais da Secretaria de Estado de Educação (SEE), Simone Aparecida Emerick, nega que o Plano de Atendimento Escolar propõe o fechamento da oferta do ensino fundamental pela rede estadual.  “Garantimos a oferta das vagas. No censo escolar podem ser verificadas as vagas ofertadas e a evolução das matrículas nas quatro redes de ensino. O Plano de Atendimento tem como objetivo a organização do atendimento aos estudantes”, afirma.

A presidente da Comissão de Educação da Assembleia, deputada Beatriz Cerqueira (PT), chamou o PAE de “Plano B do governo”, já que o Mãos Dadas fracassou. Ela afirmou que a municipalização por meio do PAE seria uma ilegalidade, tendo em vista que a descentralização das matrículas precisa de autorização dos legislativos municipais, conforme previsto na Lei 12.768, de 1998.

De acordo com a coordenadora-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-Ute/MG), Denise de Paula Romano, a municipalização já está acontecendo, com o Estado propositalmente extinguindo vagas no ensino fundamental e citou alguns exemplos. “Em Bonfinópolis e em Brasilândia de Minas [Noroeste], por exemplo, o Mãos Dadas foi recusado pelos municípios e agora não há mais vagas estaduais para o fundamental. A legislação em vigor no Estado diz que qualquer tipo de absorção tem de passar pelo poder legislativo municipal. E está sendo descumprida. Isso é ilegal”, afirmou Denise.

NA CÂMARA MUNICIPAL

A secretária municipal de Educação, durante audiência pública ontem na Câmara, não foi questionada pelos vereadores sobre a tentativa do Estado e da Prefeitura de promoverem a municipalização em Divinópolis (Foto: Reprodução/TV Câmara)

A secretária municipal de Educação de Divinópolis, Andréia Dimas, participou de audiência pública na Câmara Municipal nesta quarta-feira (20) para apresentação da prestação de contas de sua pasta. Nenhum vereador presente questionou a secretária sobre a esse processo de municipalização ocorrido nos últimos dois meses na cidade e que só foi, momentaneamente abortado,  após a denúncia partir da própria Câmara Municipal. O vereador Ney Burger PSB), em um pronunciamento no final de agosto, em altos brados, se colocou contra a municipalização. “Aqui [a municipalização] não passa”, disse ele na ocasião. Na audiência pública desta quarta-feira (20), frente a frente com a secretária de Educação, o vereador mudou o tom. “Fica até difícil fazer algum questionamento diante de uma prestação de contas tão bacana como essa”, bajulou.

Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram

 

 


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