Senador e assessor detalham participação da Prefeitura em negociata com lobistas para liberação de verbas da Lei Paulo Gustavo

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Cleitinho, Janete e Fernando Henrique: entrevista coletiva mostra participação direta da Prefeitura na negociação com lobistas (Foto: Diretoria de Comunicação/PMD)

A entrevista coletiva concedida na tarde desta quarta-feira (24) no Centro Administrativo para explicar a ação de lobistas na intermediação de verbas via Lei Paulo Gustavo para a Prefeitura de Divinópolis foi reveladora. Embora as principais perguntas não tenham sido respondidas, as declarações confirmam que a verba destinada a Divinópolis via lobistas só foi liberada pelo Ministério da Cultura através de uma solicitação feita por ofício assinado pelo prefeito Gleidson Azevedo (Novo). O ofício, conforme também foi revelado na entrevista coletiva, saiu da Secretaria de Cultura, passou pelo assessor especial e chegou ao Prefeito Gleidson Azevedo (Novo). Assinado pelo prefeito, o ofício chegou ao Ministério da Cultura e a verba de R$ 1,9 milhão foi liberada. A entrevista incluiu ainda, um novo personagem no caso, já que o ofício foi fruto de uma “negociação” iniciada pelo secretário Diniz Borges, da Cultura, com os quatro lobistas presos na última terça-feira.

A ENTREVISTA

Foi necessário convocar o senador Cleitinho Azevedo (Republicanos) como reforço da equipe da Prefeitura para a entrevista coletiva desta quarta-feira, que ainda teve a participação da vice-prefeita, Janete Aparecida da Silva (Avante) e do assessor especial do prefeito, Fernando Henrique Oliveira, responsável direto pela negociação com os lobistas para a liberação da verba de R$ 1,9 milhão do Ministério da Cultura via Lei Paulo Gustavo.

A entrevista foi motivada pela ação de agentes da Policia Federal (PF), que na tarde de terça-feira (23), prenderam quatro homens integrantes de uma quadrilha de lobistas. Dois presos são de Divinópolis, enquanto os outros dois, cuja identificação é mantida em sigilo pela Polícia Federal, são de São Paulo. Os dois divinopolitanos detidos são Douglas Alves Montenegro, filho do piloto de aeronaves, Ênio Montenegro, e da decoradora Dora Montenegro; e Aldo Gonçalves Vila França, que em suas redes sociais se identifica como “intermediador de negócios”.

A prisão ocorreu logo após os lobistas exigirem o pagamento de uma comissão de 30% sobre R$ 1,9 milhão (R$ 570 mil) liberados no ano passado pelo Ministério da Cultura. Segundo as informações oficiais, a PF foi chamada pelo assessor Fernando Henrique, que teria sido ameaçado de morte pelos lobistas. A Prefeitura só se manifestou 24 horas depois da prisão e a PF não dá detalhes da investigação.

FERNANDO HENRIQUE

O assessor especial do prefeito Gleidson Azevedo, Fernando Henrique Oliveira, revelou que inicialmente os lobistas negociaram com o secretário municipal de Cultura, Diniz Borges. O secretário, segundo Fernando Henrique, foi informado pelos golpistas que era possível conseguir a liberação de um recurso da Lei Paulo Gustavo, mas para isso era necessário encaminhar um ofício assinado pelo prefeito ao Ministério da Cultura.

Fernando Henrique disse que recebeu o ofício do secretário de Cultura, mas questionou quem seria o negociador, já que não sabia sua origem. Ainda segundo o assessor, logo depois recebeu o contato do próprio lobista que confirmou não ser do Ministério da Cultura, mas lhe disse: “não, eu não sou do Ministério da Cultura, mas tenho contato lá dentro, que vai arrumar a verba e eu que vou entregar o ofício no Ministério da Cultura”. Fernando Henrique disse que continuou questionando o homem que afirmou: “Vou arrumar a verba, eu tenho um lobista lá [no Ministério da Cultura] e a gente cobra 30%”.

Fernando Henrique declarou que o prefeito foi informado sobre a conversa com o lobista e o senador Cleitinho Azevedo também foi comunicado. “E aí agente decidiu levar na Polícia Federal. Dr. Daniel [delegado da PF em Divinópolis] nos atendeu no mesmo dia e levamos essas informações a ele. E aí a gente continuou trabalhando e a verba realmente caiu aqui na conta da Prefeitura e eles [lobistas] começaram a ligar, a pressionar, para que a gente publicasse o edital [de distribuição dos recursos] da forma que eles queriam para a empresa que eles têm na organização criminosa ganhasse a licitação”, declarou Fernando Henrique.

O assessor especial atrelou sua exoneração do cargo, ocorrida no dia 17 de outubro do ano passado, à necessidade de afastá-lo da Prefeitura diante das pressões que vinha sofrendo dos golpistas. Entretanto, a declaração de Fernando Henrique contraria os fatos. “A saída que a gente teve foi publicar aquela exoneração minha e aí eu fiquei alguns dias exonerado e mandei [mensagem] para eles ‘ó, fui exonerado e não consigo mais publicar o edital’”, garantiu o assessor. Entretanto, Fernando Henrique não ficou exonerado alguns dias, como afirmou. O decreto de sua exoneração, 15.882/2023, foi assinado pelo prefeito Gleidson Azevedo no dia 17 de outubro e o decreto de sua recontratação, 15.887/2023, foi assinado no dia seguinte, 18 de outubro. Portanto, oficialmente ele ficou exonerado por um dia, o que lhe valeu uma indenização trabalhista de R$ 71.142,00.

“NÓS PERDEMOS”

Na entrevista concedida à imprensa Fernando Henrique usa a expressão “nós perdemos”. Segundo ele, após retornar da exoneração de um dia, foi novamente procurado pelos lobistas. “Aí eu disse a eles: voltei, mas já foi feito tudo, uma empresa ganhou a licitação e infelizmente nós perdemos”. Disse que continuou sendo pressionado, já que a parte dos lobistas continuava sendo exigida. “Aí eu falei, não, beleza, pode falar comigo que eu explico o que aconteceu (…). Depois disso não fui mais procurado, até que ontem [terça-feira] chegou à Prefeitura, acompanhado de outros dois indivíduos. Durante a reunião que a gente fez na sala de reuniões eles falaram o tempo todo que eram do PCC [Primeiro Comando da Capital], que iam me matar, fizeram descrição de detalhes da minha rotina, qual era o meu carro, quem faz parte da minha família…”.

Fernando Henrique disse que após ameaçá-lo, os lobistas disseram que voltariam no final da tarde. Acrescentou que a Polícia Federal já estava monitorando o caso e quando os lobistas retornaram a tarde foram presos em flagrante por dois agentes da PF e dois policiais militares que estavam vestidos a paisana. Disse ainda que, além dos dois divinopolitanos, os outros dois lobistas são de São Paulo, sendo um deles servidor do Tribunal de Justiça do Estado.

CLEITINHO AZEVEDO

O senador Cleitinho Azevedo afirmou que vai aguardar a conclusão do inquérito pela Polícia Federal para propor a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado Federal para apurar os meios usados para a liberação de recursos via Lei Paulo Gustavo. “(sic) Porque esses elementos que tiveram aqui ano passado, tiveram aqui ontem, eles tem informação privilegiada dentro do Ministério da Cultura”, afirmou o senador. Repetiu a história do ofício, mas não explicou porque não interveio para impedir que seu irmão, o prefeito Gleidson Azevedo, enviasse um ofício ao Ministério da Cultura para receber uma verba com intermediação de lobistas. Afinal, segundo Fernando Henrique, o senador foi avisado sobre o pedido da verba antes de o ofício ser encaminhado ao Ministério.

CONCLUSÃO

É preciso que a Polícia Federal conduza esse inquérito à luz da transparência, ao contrário do que tem feito até agora, permanecendo em silêncio sobre toda a operação. Ninguém sabe a versão da PF, que nas informações prestadas até agora se limita a afirmar que os lobistas foram presos por ameaças de morte a servidor público.

O inquérito envolve verbas públicas federais e o dinheiro chegou a Divinópolis, após o prefeito assinar um ofício que deu carta branca aos lobistas para a intermediação do recurso. Se o prefeito e o senador sabiam que era uma transação ilegal, intermediada por golpistas que exigiam comissão de 30%, é preciso explicar, ainda, porque a Prefeitura utilizou o recurso, mesmo sabendo de sua procedência.

Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram

 

 


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