Os problemas causados em Divinópolis pelo trecho da linha férrea que corta o perímetro urbano estão longe de uma solução definitiva. Cruzamentos sem sinalização adequada e sem canceleiros, interrupção do trânsito em áreas de grande volume de veículos gerando longos engarrafamentos, poluição sonora inclusive nas madrugadas e trechos cortados pelos trilhos utilizados como descarte de lixo de toda espécie, são alguns dos transtornos causados ao longo de mais de 12 quilômetros de trilhos no perímetro urbano.
Ainda há a grave questão social, com o trecho sendo utilizado para venda e consumo de drogas. Protegidos pelo matagal durante o dia e sem iluminação noturna, usuários e traficantes utilizam as margens da ferrovia para a venda e consumo de drogas. Há, ainda, a questão da violência envolvendo disputa de pontos do tráfico, acerto de contas e outros conflitos, que já ocasionaram vários assassinatos.
A Vale, atual concessionária do trecho, não mostra interesse na solução desses problemas, já que isso não afeta o tráfego de trens. No máximo o que a companhia tem feito é providenciar uma limpeza no matagal, o que não ocorre com a frequência necessária.
A dona de casa Silvana de Araújo, 36 anos, residente às margens da linha férrea na altura do Bairro Niterói, contou ao Portal do Sintram que os problemas são infindáveis. “A gente enfrenta o problema dos apitos longos a qualquer hora da noite e da madrugada, não tem iluminação, traficantes de drogas circulam livremente e o povo ainda não ajuda, jogando todo tipo de lixo e fazenda necessidades fisiológicas em qualquer ponto da linha. A gente sofre muito”, relatou.
TENTATIVA
Na manhã desta quinta-feira (11) representantes da Vale e das secretarias de Meio Ambiente, Serviços Urbanos e Vigilância Ambiental fizeram uma vistoria ao longo da linha. De acordo com a Diretoria de Comunicação da Prefeitura, “o objetivo da realização desta vistoria foi verificar os pontos críticos da cidade, onde ocorrem os descartes irregulares de lixo e entulho, observando, principalmente, as áreas de perímetro urbano em que estes dejetos foram despejados”.
Após a vistoria, será definido um plano de ação para realizar a limpeza nos locais que demandam maior cuidado, em relação ao descarte irregular de lixo, à contaminação do meio ambiente e a proliferação da dengue.
Esse é o problema mais fácil de ser resolvido, mas há anos essa limpeza de lixo, entulho e dejetos não é feita na cidade. Uma solução paliativa, enquanto o contorno ferroviário continua engavetado.
CONTORNO FERROVIÁRIO
A solução definitiva para os transtornos causados pela linha férrea na área urbana é a construção do contorno ferroviário. Conforme lembra o ex-prefeito, arquiteto e urbanista Aristides Salgado dos Santos, não se pode esquecer que Divinópolis cresceu no entorno da Rede Ferroviária. “Se hoje os trilhos estão em plena região central e cortam os bairros de maior densidade populacional, isso se deve a Estrada de Ferro Oeste de Minas, que já cortava o município desde o fim do século XIX. Foram várias transformações e a cidade foi crescendo no entorno, sem um planejamento adequado, gerando a situação que a gente observa hoje”, relatou.
A construção do contorno ferroviário de Divinópolis está prevista desde o ano 2000, através da Lei Complementar 60, que instituiu o Plano de Diretor da cidade. No Plano Diretor de 24 anos atrás constava como uma das principais diretrizes no sistema viário e de transporte do município “o deslocamento da linha férrea da área urbana do Município” através da construção do contorno ferroviário.
De acordo com o Plano Diretor de 2000, o objetivo era “evitar riscos à população pelas travessias em passagem de nível, pelo transporte de cargas perigosas e por manobras; eliminar as incomodidades ambientais; e promover melhor convivência entre sistema de circulação urbana e via férrea”.
Em 2007, o então prefeito Demetrius Pereira concluiu o projeto de construção do contorno ferroviário. Em 2010, após processo licitatório, foi assinado o contrato entre o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Construtora Barbosa Mello para tocar a obra, que naquele ano foi orçada em R$ 89,9 milhões e seria bancada com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
De acordo com o projeto, o contorno consiste na construção de um desvio de 29,5 quilômetros incluindo uma ponte ferroviária, quatro passagens em dois níveis e a construção do novo pátio de manobras e recomposição de trens. O empreendimento deveria abranger ainda “a construção das obras de infraestrutura, superestrutura da via permanente, solução das interferências com estruturas de serviços de utilidade pública, obras complementares, supervisão de obras, gestão ambiental e desapropriação”.
Engavetado há 17 anos, não há perspectiva de que o contorno ferroviário sairá do papel. A última informação dada pelo Dnit dá conta de que, embora o projeto tenha sido aprovado em 2009, até hoje só foram feitos os levantamentos das áreas a serem desapropriadas e os laudos para as desapropriações. De resto, é necessário que haja vontade política para tentar tirar o projeto do papel. Sem representação política confiável, Divinópolis sabe que esse projeto de grande importância, ainda continuará engavetado por muitos anos.
LEI REVOGADA
A Lei Complementar 60/2000, que instituiu o Plano Diretor, foi revogada em 2014. O novo Plano Diretor do município foi instituído pela Lei Complementar 169/2014. O novo Plano Diretor, que 10 anos após sua aprovação ainda não passou por nenhuma revisão, também prevê a implantação do contorno ferroviário, conforme consta do artigo 24. Também prevê “Implantação do serviço de transporte ferroviário de passageiros ligando Divinópolis a Belo Horizonte e Sete Lagoas”. Tudo isso continua só no papel.
Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram