
Qual foi o verdadeiro objetivo da viagem que 41 autoridades brasileiras, todas ligadas a extrema direita, fizeram a Israel? Um país em guerra desde o ano passado contra o grupo Hamas, não é um destino seguro, conforme alertou o Ministério das Relações Exteriores do Brasil no final do ano passado. O que esses prefeitos, vice-prefeitos, secretários e até governadores foram fazer em Israel, em uma viagem bancada por uma agência oficial do governo Israelense?
A boa notícia para Divinópolis é que a vice-prefeita, Janete Aparecida da Silva (Avante), conseguiu deixar Israel após a escalada das hostilidades com o Irã e anuncia que chega a Divinópolis no final da tarde desta quarta-feira (18). Entretanto, a vice-prefeita terá que explicar o que trouxe de aprendizado e principalmente porque recebeu 14 diárias da Prefeitura no valor de R$ 3.581,06, quando toda o passeio foi bancado pelo governo israelense.
Antes mesmo de chegarem ao Brasil, os 12 primeiros integrantes da comitiva retirados de Israel pelo governo brasileiro, entre eles a vice-prefeita Janete Aparecida, já divulgaram uma nota criticando o Ministério das Relações Exteriores. A nota, postada no Instagram da vice-prefeita, diz que os integrantes do trem da alegria israelense, manifestam profundo desacordo com a nota do Itamaraty, através da qual o governo brasileiro disse que as viagens a Israel são desaconselhadas desde o ano passado.
O que a comitiva brasileira de extrema direita fazia em Israel em meio ao genocídio do povo palestino, a poucos quilômetros de distância? A resposta é uma operação de propaganda que combina lobby e venda de tecnologias de vigilância. A viagem foi integralmente custeada pela Mashav, uma agência israelense de cooperação internacional, em conjunto com o Instituto Internacional de Liderança, uma federação que representa trabalhadores israelenses. As bolsas oferecidas incluíram, segundo a própria Mashav, custos do programa, taxa de estudos, visitas técnicas e profissionais, pensão completa e transporte.
A RELAÇÃO DA DIREITA BRASILEIRA

O pesquisador do Centro de Estudos do Antissemitismo da Universidade Hebraica de Jerusalém e assessor acadêmico do Instituto Brasil-Israel, Michel Gherman, em entrevista concedida a Agência Pública no ano passado, explicou a relação da direita brasileira com Israel, a partir da ascensão do Bolsonarismo. De acordo com o pesquisador, para além do uso de Israel como inspiração, há ligações concretas também entre o bolsonarismo e a comunidade judaica brasileira, na formação de uma espécie de comunidade conservadora.
Em seus estudos, Gherman cita viagens do ex-presidente Bolsonaro (PL) a Israel e imensos projetos de construção de igrejas evangélicas brasileiras na chamada Terra Santa são alguns dos exemplos simbólicos.
O pesquisador amplia a visão sobre a extrema-direita no Brasil e suas relações com a religião, sobretudo com os evangélicos. Para ele, o bolsonarismo suscitou um discurso de perseguição da esquerda, que se assemelha com o anti-semitismo. “Se estruturou uma percepção sobre a esquerda que se tinha sobre os judeus. É preciso, nesse sentido, entender o tamanho desse buraco: os judeus foram exterminados por esse tipo de discurso”, lembra o pesquisador.
Para o pesquisador, Israel se tornou um modelo para a extrema direita brasileira: “Um elemento importante para entender a relação da nossa extrema-direita com Israel é o que chamo de representação de Israel. Que é uma Israel que existe, mas em parte uma Israel branca, armada, muito violenta, que serve como muralha contra a expansão do Islã, contra LGBTQIA+, ultracapitalista. Uma Israel que fala sobre a ausência do Estado e uma Israel cristã, ou fundamentalista religiosa. Essa relação foi muito apropriada para o bolsonarismo, que filtrou esse modelo e criou esse imaginário. Ou seja, tem menos a ver com as perspectivas concretas e mais a ver com um viés ideológico”, afirma Michel Gherman.
Embora a entrevista tenha sido publicada em 2023, o pesquisar já alertava que a “desculpa tecnológica” era usada para justificar a aproximação dos bolsonaristas com o regime de Israel. E foi exatamente com o discurso de buscar tecnologia, que a vice-prefeita de Divinópolis e mais 40 políticos da direita brasileira, viajaram de graça a Israel, ignorando alertas de guerra emitidos pelo governo brasileiro.
“Outro ponto importante, precisamente sobre essa aproximação política de Bolsonaro com Israel, é algo mais pragmático. A produção tecnológica israelense, que foi muito exaltada durante a pandemia, à exaltação dos valores liberais, mas o que eu destaco mesmo é essa produção de uma Israel imaginária que acaba produzindo vínculos concretos com a direita em Israel e no Brasil”, afirmou o pesquisador. (Os trechos da entrevista com o pesquisador Michel Gherman foram reproduzidos com autorização da Agência Pública)
Reportagem: Jotha Lee
Sintram Comunicação