Ex-ministros da saúde de Bolsonaro revelam atuação ‘inexplicável’ de Bolsonaro no combate à pandemia

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O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta deu nota 3, de zero a 10, para o governo Bolsonaro ao avaliar a condução do Executivo no enfrentamento da pandemia de covid-19. Em entrevista ao jornal O Globo, Mandetta disse que o presidente tem atuação desastrosa na crise, que demonstra mais apreço pela economia do que pela vida das pessoas e parece ter raiva dos brasileiros que perderam a vida para o vírus.

“O número de mortes fala por si. Ele (Bolsonaro) teve uma condução desastrosa. A desautorização do ministro em público, ‘manda quem pode e obedece quem tem juízo’; o ‘e daí?’; ‘não sou coveiro’; ‘gripezinha’; ‘está no final’. Está no final nada. Se teve alguma coisa digna de nota eu não saberia te citar. Nós conseguimos ativar a indústria brasileira de respiradores, foi uma coisa que conseguimos fazer quando eu estava lá, conseguimos abrir 15 mil leitos de UTI, que é uma coisa positiva. Agora, eles deixaram 7 milhões de kits no almoxarifado. O governo federal deixou as pessoas à própria sorte. Não vi nem sequer se solidarizar com quem perdeu um membro da família. É quase como se tivessem raiva das pessoas que morreram. Quem morreu é culpado.”

Para Mandetta, Bolsonaro militarizou o Ministério da Saúde e abriu uma crise tripla: “de prevenção, atendimento e vacina”. O ex-ministro considera que o titular da pasta, o general Eduardo Pazuello, não conhece nada da área.

“Ele falou várias vezes que entre a saúde e a economia, ele ia ficar com a economia. E a população começou a construir as suas linhas de defesa sem contar com a liderança da figura maior do governo. Vimos o Ministério da Saúde falando uma coisa e ele falando outra. Ele começou a criticar todo e qualquer prefeito e governador que fizesse qualquer coisa para diminuir a velocidade de transmissão para não carregar o sistema de saúde, que era o principal problema da doença. Depois ele me troca, coloca um médico. É impossível para um médico com base científica fazer política de governo, firmar uma recomendação, uma prescrição médica. Aí ele põe um militar para oferecer ordem. Faz uma intervenção militar na Saúde, mas um militar não tem a menor noção do que é Saúde. A gente passa a ter um governo federal que sai completamente do enfrentamento da Saúde e com o argumento de que o problema era de logística. Nunca foi, o problema era de Saúde pública, muito mais complexo do que carregar caixa para lá e para cá. E agora tem uma crise tripla, de prevenção, atendimento e vacina”.

Mandetta foi demitido do governo após confrontar o presidente ainda no início da pandemia.

NELSON TEICH

Ministro da Saúde entre 17 de abril e 15 de maio, o médico Nelson Teich deixou o governo ao ser pressionado pelo presidente Jair Bolsonaro a disseminar o uso da cloroquina no combate à covid-19. Dez meses após a chegada da pandemia ao Brasil e sete meses após deixar o ministério, Teich considera que o número de mortes provocadas pelo coronavírus é superior ao anunciado (hoje, oficialmente, mais de 190 mil) e já passa de 220 mil. Em entrevista ao jornal O Globo, o ex-ministro aponta a falta de liderança, de estratégia e de planejamento entre as principais falhas cometidas pelo governo federal no combate à covid-19. E também responsabiliza Bolsonaro.

“Falta de tudo: planejamento, estratégia, liderança, coordenação e informação. Tudo isso aí não é uma coisa só. As pessoas falam de temas como se fossem uma bala de prata. Dizem que a Coreia do Sul foi bem porque investiu em testagem, por exemplo. Mas a testagem faz parte de uma estratégia maior. É a forma de evitar que as pessoas passem (o vírus) para os outros. Os países que tiveram grande controle foram os que conseguiram evitar casos novos. Tem países que fizeram coisas diferentes e deram certo. É um conjunto de ações. Tem que ter diálogo imenso com estados, municípios, uma comunicação com a sociedade forte. Por isso, estratégia e planejamento são fundamentais.”

Para Teich, Bolsonaro atrapalhou o combate à pandemia ao ter um discurso não alinhado ao do ministério. “Numa situação como essa, você tem que ter uma coordenação em linguagem única máxima. Toda vez que você tem um conflito de informações, de mensagem, de posicionamento, você confunde as pessoas. Não ter uma comunicação alinhada, forte, todo mundo mandando a mesma mensagem, dificulta o combate à pandemia, claramente”, afirmou.

“Liderança não é uma coisa que você consegue por decreto, precisa ser legitimada. O líder real não se impõe, ele é escolhido. Os estados, municípios precisam ver que é melhor estar com o governo federal do que sozinhos. E tem que haver um trabalho de comunicação também. Chegamos agora a um cenário parecido com o início da pandemia, com problemas de falta de equipamentos. Já devemos ter chegado a 220 mil mortos, porque há uma subnotificação”, diz.

Teich admite que a pressão do presidente para que o ministério encampasse a defesa do uso da cloroquina, mesmo sem comprovação científica sobre a eficácia do medicamento contra o coronavírus, foi a gota d’água para que ele deixasse o governo. “Foi um gatilho que me fez enxergar que eu não teria autonomia e legitimidade para fazer as mudanças que precisavam ser feitas. Eu poderia ter pegado carona com o Conselho Federal de Medicina (que defendeu à época a possibilidade de prescrição mais ampla, até então restrita aos pacientes graves), mas como vou aprovar um remédio que não funciona? Se meu lado técnico, que era um dos meus pontos fortes, não é respeitado, decidi que não havia como continuar.”

Fonte: Congresso em Foco

 

 


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