Em audiência pública na Câmara, vereadores são denunciados por furar a fila única da rede municipal de saúde

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Em atendimento a uma solicitação do vereador Rodyson do Zé Milton (PV), a Comissão de Saúde da Câmara Municipal de Divinópolis realizou audiência pública na última quarta-feira (18) para discutir o descumprimento da Lei Municipal 8.864/2021, que obriga o município a publicar na internet a “lista de espera dos pacientes que aguardam por consultas (discriminadas por especialidade), exames e intervenções cirúrgicas e outros procedimentos da rede pública de saúde”. Sancionada pelo prefeito Gleidson Azevedo (Novo) em julho de 2021, somente há 90 dias a lei começou a ser cumprida, ainda assim, parcialmente.

A vice-prefeita Janete Aparecida da Silva Oliveira, que também ocupa a Secretaria de Governo, foi a principal voz do Executivo para responder a maioria dos questionamentos, mesmo com a presença do secretário de Saúde, acompanhado de boa parte da equipe da Semusa. Entretanto, seu papel na audiência chegou a ser constrangedor, uma vez que foi arrogante ao se dirigir a cidadãos que apresentavam questionamentos sobre o sistema de saúde, respondeu a maioria das perguntas dirigidas ao secretário municipal de Saúde, Alan Rodrigo da Silva e à equipe da Semusa, e grande parte de suas repostas foi inconclusiva, como por exemplo, “estamos trabalhando nisso”, “vamos fazer”, “fizemos reunião para discutir o assunto”.

Sobre o descumprimento da Lei que obriga a publicação da fila de espera, Janete Aparecida responsabilizou o sistema de informática de gestão integrada da Prefeitura. Segundo ela, o sistema anterior utilizado pela Prefeitura, o Sonner, não comportou a lista devido ao tamanho do documento. Em abril desse ano, a Prefeitura firmou contrato com a Betha Sistemas, para fornecimento de novo sistema integrado de gestão pública, que permitirá a publicação da lista completa.  Por um ano de contrato, a Betha receberá R$ 4 milhões.

“Somente há 90 dias, foi passado para os técnicos de informática da Prefeitura buscar as soluções para disponibilizar a relação dos pacientes na fila de espera no site institucional da Prefeitura”, informou a vice-prefeita. Segundo ela, em setembro, a lista de espera começou a ser disponibilizada no sistema. “Ainda assim, não está sendo colocada 100%, mas na forma possível de acordo com a migração [de dados, de antigo para o novo sistema]”, afirmou. De acordo com um técnico de informática da Prefeitura, identificado apenas como Roberto, “quando a migração dos dados toda for feita [para o novo sistema] será possível trabalhar de uma forma que atenda perfeitamente a lei [8.864]”

Para tentar minimizar o tamanho da fila, a vice-prefeita, mais uma vez fez nova promessa: “Nós vamos comprar consulta para tentar diminuir essa fila, usando uma sobra [de recursos] da covid-19. Não é suficiente. Nós vamos precisar de mais recurso porque a fila é bem extensa”, afirmou.

O TAMANHO DA FILA

Numa das poucas vezes que a vice-prefeita permitiu que o secretário de Saúde, Alan Rodrigo da Silva, se expressasse durante a audiência, ele afirmou que o aumento da fila de espera se agravou mais após a pandemia da covid-19. “A gente está falando de especialidades e especialidades tem sido um gargalo de anos no SUS e com a pandemia [da covid-19], com represamento de dois anos e meio, sem fazer consultas especializadas e alguns exames especializados, esse cenário se agravou ainda mais”, afirmou secretário.

Embora a discussão fosse de grande importância para todo o sistema, autoridades responsáveis pelos principais órgãos de gestão da saúde no município não atenderam ao convite da Câmara para participar da audiência. Foi o caso de Ludmila Monteiro Barbosa, diretora técnica do Instituto responsável pela gestão da UPA. Ela enviou representantes. A superintendente regional de Saúde, Kênia Silveira Carvalho, justificou ausência por “incompatibilidade de agenda” e não enviou representantes.

Dos representantes de Divinópolis na Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional, apenas a deputada estadual Lohanna França (PV) compareceu à audiência. O deputado federal Domingos Sávio (PL) não compareceu, mas enviou representantes que se mantiveram em silêncio durante toda a audiência. O senador Cleitinho Azevedo (Republicanos) e o deputado estadual Eduardo Azevedo (PL), irmãos do prefeito Gleidson Azevedo (Novo), não compareceram, não justificaram e não enviaram representantes.

Os vereadores Anderson da Academia (PSC), Breno Júnior (PSD), Diego Espino (PSC), Hilton de Aguiar (MDB), Josafá Anderson (CDN) e também não compareceram.

Quem também não compareceu foi a Diretora Executiva da Fundação Geraldo Corrêa (Hospital São João de Deus), Elis Regina Guimarães. Ela justificou sua ausência em razão da participação de um  encontro no Hospital das Clínicas em São Paulo e enviou dois representantes com autoridade para responder aos questionamentos. Em ofício encaminhado à Comissão de Saúde, Elis Regina destacou a importância da publicação da fila de espera. “A Lei 8.864 representa um avanço significativo no que diz respeito à transparência e gestão dos serviços de saúde, afetando diretamente a qualidade de vida dos cidadãos de Divinópolis”, afirmou.

DENÚNCIA

Irislaine Duarte, Agente Comunitária de Saúde e Conselheira de Saúde, denuncia vereadores por furar a fila da saúde

A agente comunitária de saúde, Irislaine Duarte, conselheira do Conselho Municipal de Saúde (CMS), fez uma grave denúncia durante a audiência. Segundo ela, há vereadores furando a fila. “Eu vi, eu não estou falando ‘que me falaram’. Eu vi, por várias vezes, usuários chegando ao Posto de Saúde e falando: ‘eu quero me consultar, porque eu tenho minha consulta marcada com ginecologista, que um vereador conseguiu pra mim, só que eu preciso do encaminhamento’. Isso é muito sério. A gente vê uma fila gigantesca e chega denúncia todos os dias de que pessoas facilitaram para que outras pessoas passassem na frente”, afirmou.

Irislaine Duarte foi mais além: “a gente tem prova de que houve fura-fila e a gente precisa que a lei seja regulamentada de acordo com a política de Atenção Básica, que determina que quem tem que gerenciar essa fila, é o profissional da ponta, que tem vínculo com a população, que tem vínculo com a comunidade e era o que acontecia. E a gente sabe que tem preferência do Legislativo por gente na fila e a gente tem como provar isso”, concluiu.

A servidora Jaqueline Camargos, que trabalha na ponta do serviço de saúde, citou apenas o exemplo da oftalmologia. Segundo ela, há paciente aguardando cirurgia de glaucoma desde 2020. “E pessoas que consultaram em 2023 com simples acuidade visual, já marcaram”, revelou. “E fui eu que entreguei [o encaminhamento]. Eu fiz questão de fotografar todos, porque eu achei um absurdo”.

“Tem que organizar sim, tem que limpar principalmente a porta de entrada de onde marca [as consultas]. Se é pelo sistema, tem que ser pelo sistema. Não pode funcionar através de amigo, de amigo do amigo, de fulano, de vereador, e a gente recebe isso todos os dias: ‘me dá o número do meu protocolo, porque vereador vai marcar pra mim’. Isso acontece muito”, finalizou Jaqueline.

A Câmara Municipal ainda não fez um pronunciamento oficial sobre as denúncias,  mas já há um movimento entre um grupo de vereadores, para que seja feita a identificação dos parlamentares fura-fila da saúde.

Mas, qual o tamanho da fila de espera? A equipe da Prefeitura foi questionada durante a audiência sobre quantas pessoas aguardavam ou quantos procedimentos estão na fila. Essa pergunta nem a vice-prefeita respondeu.

Reportagem: Jotha Lee
Comunicação Sintram 

 

 


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