O que há em comum entre as redes de varejo Centauro, Havan e Riachuelo, as academias Bio Ritmo e Smart Fit e as cadeias de restaurantes Coco Bambu e Madero? Todas essas empresas, assim como outras tantas (veja a lista no final do texto), têm como controladores ou sócios empresários que apoiam o presidente Jair Bolsonaro. Vários deles estão bastante engajados na convocação para as manifestações de 15 de março. A maioria pertence ao grupo Brasil 200, plataforma constituída por empresários e profissionais liberais que apoiaram Bolsonaro na eleição presidencial.
Alguns se tornaram influencers e colecionam seguidores na maior e mais poderosa mídia dos tempos atuais, que é aquela formada pelas redes sociais. Uns se tornaram até próximos da família Bolsonaro, que tende a ser fechada a recém-chegados.
Mas nem tudo são flores para quem se acercou do poder. As mesmas mídias sociais que deram visibilidade ao ex-deputado autodenominado “mito” e ao seu ideário de extrema-direita são usadas agora por consumidores que resolveram aderir ao boicote. A empresa Smart Fit foi uma das primeiras vítimas.
Sócio das academias Smart Fit e Bio Ritmo e um dos líderes do Brasil 200, o empresário paulista Edgard Corona paga o preço de ter compartilhado no WhatsApp vídeos de ataques ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. Conforme revelou a jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, Corona, além de compartilhar, defendeu o impulsionamento dos vídeos.
Embora seja o maior responsável pela aprovação da reforma da Previdência e de outras pautas importantes para o governo, Maia é alvo constante da desconfiança dos bolsonaristas, talvez por ter se transformado no principal contrapeso às vociferações da família Bolsonaro contra princípios democráticos, jornalistas , ambientalistas , indígenas , juristas , para ficar apenas em alguns exemplos.
Como publicou o jornal inglês The Guardian,primeiro veículo jornalístico a noticiar o boicote, a coisa começou em um grupo fechado do Facebook, com 320 mil membros, voltado para a população LGBT . “Estou tentando combater um sentimento de impotência”, explicou ao jornal o autor da iniciativa, o professor de Jornalismo Edwin Carvalho. “Sou professor universitário, jornalista e gay. Sou tudo que Bolsonaro mais detesta no mundo”.
Perdendo clientes em razão do posicionamento político do seu fundador, a Smart Fit enviou ao jornal britânico mensagem na qual ressaltou que é favorável à causa LGBT+, não apoia políticos nem partidos e sua “missão é possibilitar o acesso democrático ao fitness de alto padrão”.
Quem também começou a colher críticas foi o paranaense Junior Durski. Dono da rede Madero, gravou um vídeo declarando apoio aos atos do dia 15: “Estou 100% com o presidente Jair Bolsonaro, em quem eu tenho muito orgulho de ter votado, de ter trabalhado na campanha, de ter ido para a rua todas as vezes em que tivemos que ir e que vamos de novo para as ruas neste 15 de março”.
Resultado: na sexta-feira (6), a hashtag #MaderoNuncaMais tornou-se um dos temas mais comentados do Twitter brasileiro. Mobilizações semelhantes têm sido feitas contra outras empresas cujos proprietários continuam a apoiar Bolsonaro, sobretudo aqueles engajados na organização das manifestações de 15 de março. Os atos e o envolvimento de membros do governo em sua preparação geraram grave crise política ainda durante o Carnaval , em razão da percepção geral de que o Palácio do Planalto incentiva uma articulação divulgada por ativistas que fazem defesa declarada do fechamento do Congresso Nacional e do STF e da volta da ditadura militar. Quase todas as forças políticas e até o habitualmente discreto ministro Celso de Mello condenaram o comportamento de Jair Bolsonaro. Apesar disso, no sábado (7), ele preferiu tornar público o apoio ao ato, também conhecido como “Dia do Foda-se” , que até então ele negava apoiar, alegando que a manifestação é a favor do governo, não contra o Parlamento e a democracia.
Boicotar empresas por razões políticas, segundo o advogado Antônio Rodrigo Machado, é algo inteiramente de acordo com a legislação em vigor. “Todo o consumidor tem o direito de expressar sua opinião, assim como todas as empresas também podem, desde que fora do período eleitoral. São movimentações democráticas lícitas”.
Fonte: Folha de S.Paulo
(Foto: Redes sociais)