Procedimento também apura possíveis irregularidades em mudanças na composição do Conselho

O Ministério Público (MP) instaurou no último dia 12 de agosto um procedimento para investigar o Conselho Municipal de Defesa e Conservação do Meio Ambiente (Codema), por suspeição de privilégios na concessão de licenciamentos ambientais sem pareceres técnicos para construção de condomínio no entorno da Lagoa do Sidil. O MP informa que o procedimento vai apurar a denúncia de “possíveis irregularidades praticadas pelo Codema, haja vista a aprovação de autorizações ambientais, sem o suporte técnico/legal, para fins de intervenção para instalação de loteamento no entorno da Lagoa do Sidil”.
Ainda de acordo com o MP, a denúncia também abrange a “abertura da Avenida Divino Espírito Santo até o barramento do curso d’água e limpeza dos locais de intervenção, mediante uso de máquinas, além da violação do princípio da publicidade e alteração irregular da composição do Codema”.
ENTENDA
O Codema é um órgão colegiado com a função de atuar na formulação da política ambiental e de desenvolvimento sustentável do município. Ele analisa os impactos ambientais de novos empreendimentos, discute temas ambientais relevantes e emite diretrizes, recomendações e posturas sobre planos, programas e projetos. Uma das principais funções do Conselho é avaliar os impactos ambientais de novos empreendimentos e emitir pareceres sobre a viabilidade ambiental.
No procedimento que está em andamento no MP, um dos itens investigados são prováveis irregularidades nas alterações promovidas na composição do Codema pelo prefeito Gleidson Azevedo (Novo) que teria como objetivo “facilitar” o licenciamento ambiental para um condomínio que se pretende construir às margens da Lagoa do Sidil.
A diretoria do Codema tem mandato de dois anos e a nomeação para o biênio 2024/2025 aconteceu através do Decreto 16.100/2024, publicado no dia 15 de março de 2024. Estranhamente, e sem justificativas, a composição do Conselho sofreu quatro alterações até o dia 28 de maio desse ano. Uma fonte, que será preservada nessa reportagem, informou ao Portal do Sintram que nesse período o prefeito Gleidson Azevedo baniu do Codema todos os conselheiros que questionaram as concessões de licenciamentos sem os obrigatórios laudos técnicos. Um dos empreendimentos beneficiados é o condomínio residencial a ser construído às margens da Lagoa do Sidil.
As alterações promovidas na composição do Codema afastaram representantes da OAB/Divinópolis, Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ), Instituto Estadual de Floresta (IEF), Corpo de Bombeiros, Federação das Associação de Moradores de Bairros e Conselhos Comunitários Rurais de Divinópolis (FAMBACORD), Instituto Ambiental Ação e Consciência (IAAC), Grupo Educação, Ética e Cidadania (GEEC) e Secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Todos esses conselheiros substituídos questionavam o licenciamento para a construção do condomínio na região da Lagoa do Sidil.
LICENCIAMENTO CONCEDIDO
Em reunião realizada no último dia 7 de agosto, o Codema concedeu o licenciamento para a o Condomínio Horizontal Fechado La’Reserve, a ser erguido na região da Lagoa do Sidil. O projeto prevê uma área construída de 55,1 mil metros quadrados e, em contrapartida, a empresa São Miguel Aluguel Imóveis, situada na cidade de Cláudio e proprietária do condomínio, terá que executar obras de R$ 1,4 milhão na região do condomínio. Essas obras, conforme termo de compromisso já assinado com o município, incluem a abertura da Avenida Divino Espírito Santo, entre a Avenida Paraná e Rua Antônio Amaral.
A reunião do Codema do dia 7 de agosto está sob suspeita e consta da investigação do Ministério Público, conduzida pelo promotor Alessandro Garcia. A cronologia dos acontecimentos revela algumas informações importantes. No dia 22 de maio desse ano, através do Decreto 16.705/25, o prefeito Gleidson Azevedo aprovou o projeto de parcelamento de solo urbano para a construção do Condomínio La’Reserve. No dia 28 de maio, através do Decreto 16.716/25, o prefeito promoveu a quarta e última alteração na composição do Codema. No dia 7 de agosto, o Codema aprovou o licenciamento ambiental para a construção do condomínio sem exigir os laudos técnicos obrigatórios.
A REUNIÃO DO DIA 7
A reunião do Codema do dia 7 de agosto está sob suspeita e uma sequência de fatos está sendo investigada pelo MP. Em resposta ao Ministério Público, o secretário municipal de Meio Ambiente e Cuidado Animal, Danilo Teixeira, confirmou que três itens foram apreciados por inclusão na reunião, todos tratando da questão da Lagoa do Sidil. Disse que a inclusão foi baseada “na prerrogativa de gestão e no entendimento de interesse público imediato, haja vista a importância da obra a ser realizada e custeada pela iniciativa privada (…) pelo empreendimento aprovado nas proximidades da Lagoa do Sidil”.
Na reunião, foi autorizada a limpeza vegetativa da Avenida Divino Espírito Santo, entre a Avenida Paraná e o barramento da lagoa. A denúncia de irregularidades na reunião do Codema foi formalizada pela servidora municipal de carreira Ana Carolina Castro, técnica ambiental da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Defesa Animal (Semac). Segundo ela, o conselho aprovou uma “limpeza” a toque de caixa, sem parecer técnico e jurídico, o que inclui a derrubada de árvores em Área de Preservação Permanente (APP).
Durante a reunião, Ana Carolina perguntou se havia parecer técnico-mjurídico para a intervenção na área da Lagoa do Sidil. Em resposta, o secretário Danilo Teixeira confirmou que não havia o parecer técnico obrigatório. Ao MP, o secretário afirmou que não houve irregularidades na condução da reunião do Codema realizada no dia 7 de agosto, bem como na condução de processos que tramitam na secretaria.
POLÍCIA
No dia 3 desse mês, a Polícia Militar do Meio Ambiente registrou um boletim de ocorrência sobre a devastação ambiental na região da Lagoa do Sidil. De acordo com o boletim, foi constatada a supressão (derrubada) de árvores no local, entretanto, o secretário do Meio Ambiente, Danilo Teixeira, apresentou a autorização concedida pelo Codema na reunião do dia 7 de agosto. O registro policial diz que a derrubada de árvores estava “em conformidade com a decisão do Codema, em reunião realizada em 7 de agosto de 2025”, que autorizou a intervenção para fins de limpeza da vegetação para a realização de levantamento topográfico.
À Polícia, o secretário disse que há previsão de modificações no trajeto do curso d’água, porém para isso ainda será apresentado projeto técnico ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) para a prévia regularização dessa futura intervenção.
MINISTÉRIO PÚBLICO
O procedimento em andamento no Ministério Publico apura possíveis irregularidades na tramitação do licenciamento no Codema, inclusive irregularidades na observância do Regimento Interno do órgão na reunião que concedeu a licença ao empreendimento La’Reserve. O MP também investiga a falta de estudos ambientais e do parecer técnico e jurídico.
No dia 20 de agosto, a Prefeitura publicou uma nota em seu site afirmando que a construção do condomínio permitirá a “revitalização da área, com obras de mobilidade urbana que transformarão o espaço em um novo cartão-postal de Divinópolis”.
O prefeito Gleidson Azevedo, segundo a nota publicada pela Prefeitura, comemora a obra. “Estamos resgatando um espaço que, por muitos anos, foi deixado de lado. Nosso objetivo é oferecer à população um novo cartão-postal, um local para as famílias desfrutarem com segurança e qualidade. Esse é mais um passo no compromisso que temos de cuidar da cidade e de quem vive nela”, declarou o chefe do Executivo.
LEGALIDADE
Embora a Prefeitura esteja vendendo a imagem de que a obra vai resolver um antigo problema, o que se discute é a legalidade na condução do processo, as modificações feitas na composição do Codema, a reunião do Conselho que liberou o licenciamento para limpeza sem pareceres, entre outras denúncias que estão no MP.
O vereador Vitor Costa (PT) é o autor da denúncia no Ministério Público. Ele entende que a verdade está sendo camuflada pelo Executivo. “Mas a realidade é outra: o que está acontecendo ali é supressão ilegal de vegetação em área de preservação permanente, sem inventário florestal, sem parecer técnico e sem estudo de impacto. Isso não é revitalização, é crime ambiental”, assegura o vereador.
O petista denuncia, ainda, que a velha política continua sendo praticada na cidade. “Essa é uma velha prática da política atrasada. Enquanto destroem o meio ambiente, tentam manipular a opinião pública com propaganda barata, como se a população fosse ingênua. Colocam faixa para esconder a verdade, quando o que deveriam apresentar são licenças ambientais, estudos técnicos e transparência”, acrescenta.
Além do Ministério Público, o vereador denunciou o caso no Igam, IEF e à Polícia Militar de Meio Ambiente. “O que quero é uma resposta clara: quem autorizou essa obra? Onde estão os estudos de drenagem, se a Lagoa do Sidil sempre teve histórico de alagamentos? Quem responde pela retirada de árvores nativas, sem nenhum plano de compensação ambiental?”, questiona Vitor Costa.
Reportagem: Jotha Lee
Sintram Comunicação